Wanda #16: Festival Sarará e as cores da TV
O que rolou no Sarará 2025 e o cotidiano de claro bicho
Olá!
A Wanda voltou! Foi só um tempinho fora, pra ajeitar a casa, passar uma vassoura, colocar as coisas no lugar…
Nesta edição, falamos sobre como foi a 12ª edição do Festival Sarará, que aconteceu nesse sábado (24), no Parque das Mangabeiras, em Belo Horizonte.
E ainda clara bicho – ou Clara Campos, como vocês a conhecem por aqui – fala sobre o processo de produção do seu primeiro EP, Cores da TV. A cantora e compositora mineira reflete sobre como o cotidiano é um tema em comum em obras de diversas artistas femininas – como ela e como a própria Wanda Pimentel.
Esperamos que gostem!
Sarará reúne todas as tribos no Parque Mangabeiras
Festival atraiu público de diferentes regiões e misturou ritmos e culturas no pé da Serra do Curral
Por Júlia Ennes
A 12ª edição do Festival Sarará aconteceu neste sábado (24), no Parque das Mangabeiras, em Belo Horizonte. Com a Serra do Curral de fundo, o festival foi palco de uma mistura de estilos e contou grandes nomes da música brasileira atual como Liniker e o rapper BK’.
A line-up trouxe ainda O Kannalha, Lamparina, Budah, TZ da Coronel, Febre 90, Iza Sabino e Afrekassia. Além disso, tiveram as apresentações “Ritmos do Norte com Carol Blois”, “Baile Room convida Febem e MC Morena”, “Red Bull Dance Your Style” e o projeto “Vem Pra Roda” – uma homenagem às raízes do samba, com rodas comandadas pelos mineiros Samba do Belka, Samba do Quintal, Três Preto, Samba no Topo e Samba do Cacá.
A banda belo-horizontina Lamparina foi um dos destaques da tarde. Eles agitaram o público com seus maiores sucessos, especialmente do álbum Original Brasil. Em entrevista à Wanda, a vocalista Marina Miglio disse que tocar em casa é sempre melhor, pois sente que o público está mais conectado com as músicas. Porém, ela disse estar cansada dos hits que acumula. “É bom demais, mas nós também já não estamos aguentando mais tocar essas músicas”, brinca. “Ela quer as novas, gente!”, ri e completa o guitarrista e vocalista Cotô Delamarque.
Esta não foi a primeira vez que o Lamparina se apresentou no Sarará, mas no Parque Mangabeiras sim. O guitarrista Stênio Galgani destacou a importância de estar ali. “É necessário a gente ocupar essa Serra do Curral de forma consciente, principalmente, trazendo cultura, ao invés de outras coisas…”. O guitarrista parou a frase por aí, mas o colega de instrumento se arriscou em completar: “Ao invés de ser ocupada só por esses ricão safado”, brincou Cotô.
Enquanto Lamparina agitava o palco Amstel, Iza Sabino rimava no Paredão. Para a cantora, estar entre as atrações de um grande festival na cidade onde nasceu é a realização de um sonho. “Foi um momento muito mágico, principalmente por estar com outras artistas que me representam e que eu admiro muito”, afirmou.
Pergunto à Iza se havia algum artista que ela estava ansiosa para encontrar nos bastidores e, sem hesitar, ela responde: Liniker. “Admiro muito ela e acredito que futuramente a gente tem muito a colaborar. As nossas músicas podem linkar bastante e eu pretendo fazer com que um dia isso aconteça”, revela.
E ela não era a única com grandes expectativas em torno da headliner. A MC, cantora e compositora Lua Zanella estava trabalhando na equipe de apoio do festival, enquanto aguardava ansiosa pelo show de Liniker. “As músicas dela são trilhas sonoras de todos os nossos perrengues, das nossas desilusões amorosas e também da nossa esperança — aquela que a sociedade não espera dos nossos corpos, mas que a gente precisa ter”, disse.
Teve também gente que veio de longe para ver a cantora paulista e os shows da noite. O relógio ainda não tinha passado das 14h e Cristiane já estava grudada na grade ao lado do amigo Guilherme. “Eu vou ficar [na grade]. Eu vim lá do Mato Grosso do Sul só para este festival”, conta.
Já Amanda veio do Norte de Minas para curtir o Sarará. “São muitas referências: Liniker, O Kannalha, que é da Bahia, ‘BK… Quero ver todos, esse grande encontro”, contou.
Com o cair da noite, o Parque das Mangabeiras foi enchendo cada vez mais de uma multidão que foi especialmente para assistir os headliners que fechariam o festival. ‘BK abriu o show com Cacos de Vidro, hit do álbum Diamantes, Lágrimas e Rostos para Esquecer com participação de Evinha. Foi um início arrepiante que deu o tom de um show cheio de mensagens profundas e referências a ícones da música brasileira – como é o último trabalho do rapper.
Por fim, Liniker fechou a festa com chave de ouro e atendeu as expectativas de uma multidão que tinha todas as letras na ponta da língua. A autora de Caju é gigante no palco. É dona não apenas de músicas que se conectam profundamente com o público, mas também de uma atitude e presença que prende o olhar da plateia.
O Festival Sarará, mais uma vez, provou ser um espaço de encontro entre culturas, sons e corpos. A line-up pode até não ter sido a dos sonhos para todo mundo, mas entregou. Foi, sem dúvida, a celebração da diversidade que o festival tem como bandeira.
Meu Quarto, a Rua, as Cores da TV e as árvores do fundo do quintal… Por que nos envolvemos tanto com as coisas mais simples?
Quero saber as cores…🎵
Por Clara Campos
Recentemente foi publicada uma matéria na revista Noize sobre o meu EP, Cores da TV. O texto foi escrito pelo jornalista (e músico) Erick Bonder, que me entrevistou por ligação. Na época, conversamos por um bom tempo sobre minhas inspirações para o disco, como foi produzido e coisas afins. Para a divulgação do texto, em um post da revista no Instagram, estava em destaque as minhas aspas “Gosto de compor de forma simples, não busco algo intelectualizado. As coisas cotidianas significam muito mais do que as palavras rebuscadas.”
Sinceramente, não me lembrava dessa exata frase, mas me recordava de ter sim falado bastante sobre essa ideia na entrevista. Agora, pensando de forma mais distante, percebi que a minha obra inteira é meio que só sobre isso: os objetos que cercam a minha vida cotidiana. E por objetos eu quero dizer as pessoas, incluindo eu mesma, os lugares, as memórias, os sonhos, os traumas, além dos próprios objetos mesmo, no sentido mais óbvio da palavra.
Nunca tive a intenção de complicar, mas, de toda forma eu penso: será que a nossa vida toda não é simplesmente sobre isso? Tem como escrever sobre algo que não seja a sua própria vida cotidiana?

O destaque para essa fala minha, entre tantas outras, despertou-me a atenção. Então, comecei a buscar na memória o fato de que, desde a adolescência, eu consumo bastante arte que se volta para esse tema do cotidiano, do simples.
De imediato, vieram a nossa Wanda Pimentel com os seus Envolvimentos, alguns filmes da Chantal Akerman, em especial Salute ma Ville (1968), músicas, como as do Paramore em que a Hayley Williams cantava simplesmente sobre os seus próprios sentimentos (de The Only Exception a Ignorance)…
Resgatando esse histórico, o meu quarto e a rua parece que, para mim, sempre representaram essa dicotomia entre o mundo exterior, com seus vários agentes e tensões, e o mundo interior de cada um de nós, onde guardamos as coisas que o tempo nos deu. Especialmente, percebo que a grande maioria dos artistas que eu acompanhei a minha vida toda, independente do suporte artístico, são mulheres escrevendo sobre seus sentimentos e sobre o seu dia a dia.
Sem dúvida, as obras que me acompanhavam e me emocionavam de fato, estavam muito distantes de filmes de super-heróis, ou ficção científica, sempre me apeguei ao que parecia, de alguma forma, mais real. E, tenho a impressão muito particular de que, o fato de nós mulheres não sermos incentivadas (inclusive, muitas vezes reprimidas) a falar sobre os nossos sentimentos e a nossa própria vida de maneira não romantizada ou erotizada, faz com que a arte seja um lugar perfeito para suprimir essa necessidade. A liberdade da criação artística permite se fazer, de alguma maneira, ouvida.
Enquanto os homens podem sonhar com mundos completamente diferentes, às vezes, até interplanetários, nós mulheres temos que nos concentrar em simplesmente conseguir viver a realidade. E, honestamente, não acho que isso seja algo inerentemente ruim, ter os pés na realidade parece a melhor forma de viver a vida e, talvez a única possível para enfrentar o mundo de fato.
As árvores do fundo do quintal Mandam lembranças De quando a gente era criança E as cores da TV Não parecem mais me entreter Eu quero voltar pro mundo
eu tô viciada no cores da tv! <3